O TRÁGICO NA MÚSICA

A CARMEN DE BIZET COMO EXPRESSÃO DA TENSÃO APOLÍNEO-DIONISÍACA

Resumo

Pretendo defender uma possibilidade de interpretação da ópera Carmen de Georges Bizet através dos conceitos nietzschianos de apolíneo e dionisíaco. Considero que podemos estudar o teor estético desta obra por meio dessa perspectiva, do seguinte modo: haveria, ao longo da obra, um conflito de forças entre o apolíneo (representado pela personagem Micaela), e o dionisíaco (representado pela personagem título da obra), em torno das ações de Don José, o herói que oscila entre as duas pulsões originárias. Enquanto disposto ao lado apolíneo, Don José vive harmoniosamente, de acordo com os parâmetros de conduta instituídos pela sociedade, pretendendo seguir adequadamente as suas funções cotidianas em prol da realização desse objetivo. Por sua vez, quando interage com Carmen, Don José sofre a experiência dionisíaca de dissolução da regra individual, pois Carmen não preconiza a justa medida, mas a embriaguez e a dança sensual como expressão da liberdade da vida. Inserido entre esses dois pólos, vemos a trajetória de Don José partir da afirmação do equilíbrio rumo ao excesso, conseqüência necessária para aquele que se deixa seduzir pelo impulso dionisíaco. Quando José mata Carmen, no fim da ópera, tal fato decorre pela incapacidade de continuar vivendo na intensidade trágica, que o levaria ao caos, pois a individuação se mantém em frágeis linhas de controle. Ao matar sua amada, José não consegue se livrar do impulso desmedido, pois já se tornara um homem dionisíaco.