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Números complexos e grandezas elétricas vetoriais sob a ótica da Teoria dos Registros das Representações Semióticas
Complex numbers and vector electrical magnitudes under the optics of the Theory of the Registers of Semiotic Representations
Números complejos y magnitudes eléctricas vectoriales debajo de la óptica de la Teoría de los Registros de Representaciones Semióticas
Revemop, vol.. 1, núm. 2, 2019
Universidade Federal de Ouro Preto

Artigos

Revemop
Universidade Federal de Ouro Preto, Brasil
ISSN-e: 2596-0245
Periodicidade: Frecuencia continua
vol. 1, núm. 2, 2019

Recepção: 29 Setembro 2018

Aprovação: 08 Fevereiro 2019

Publicado: 01 Maio 2019

Copyright Revemop 2019.

Este trabalho está sob uma Licença Internacional Creative Commons Atribuição-NãoComercial-Compartilhamento Pela Mesma Licença.

Resumo: Este artigo aborda como o conceito matemático de número complexo é apresentado em alguns livros didáticos adotados na disciplina Circuitos Elétricos, no que se refere à presença de representações semióticas dos números complexos e das representações semióticas das grandezas elétricas relacionadas. O embasamento teórico foi dado pela Teoria dos Registros de Representações Semióticas de Raymond Duval e os procedimentos metodológicos procuraram seguir a Metodologia de Análise de Conteúdo de Laurence Bardin. Estabelecidas as categorias de análise, buscou-se investigar de forma qualitativa e quantitativa a presença de representações semióticas de números complexos e de grandezas elétricas em quatro livros didáticos, e as transformações cognitivas dessas representações. Concluiu-se que, nesses livros, as representações algébricas cartesianas e algébricas polares predominam nas abordagens dos números complexos e, em consequência, também predominam as conversões desses tipos de representações. Este artigo mostra a aplicabilidade da Teoria dos Registros de Representações Semióticas em áreas afins da Matemática.

Palavras-chave: Educação Matemática, Análise de livros didáticos, Números complexos, Grandezas elétricas vetoriais, Teoria dos Registros de Representações Semióticas, Educación Matemática, Análisis de libros de texto, Números complejos, Grandezas eléctricas vectoriales, Teoría de los Registros de Representaciones Semióticas.

Abstract: This article discusses how the mathematical concept of complex number is introduced in some textbooks used in electrical circuits, as regards the presence of semiotic representations of the complex numbers and the semiotic representations the electrical related quantities. The theoretical basis was given by the theory of Semiotic Representations records for Raymond Duval and the methodological procedures sought to follow the content Analysis methodology of Laurence Bardin. Set out the categories of analysis, we sought to investigate qualitatively and quantitatively the presence of semiotic representations of complex numbers and electrical quantities in four textbooks, and cognitive transformations of these representations. It was concluded that, in these books, the algebraic representations and algebraic polar Cartesian predominate in the approaches of complex numbers and, consequently, also the conversions of these types of representations. This article shows the applicability of the theory of Semiotic Representations records in related fields of mathematics.

Keywords: Mathematics Education, Analysis of textbooks, Complex numbers, Vector electrical magnitudes, Theory of the Registers of Semiotic Representations.

Resumen: Este artículo discute cómo el concepto matemático de número complejo es introducido en algunos libros de texto utilizados en circuitos eléctricos, en cuanto a la presencia de representaciones semióticas de los números complejos y las representaciones semióticas las cantidades relacionadas con eléctrica. La base teórica fue dado por la teoría de registros de representación semiótica de Raymond Duval y los procedimientos metodológicos que intentó seguir la metodología de análisis de contenido de Laurence Bardin. Establecidas las categorías de análisis, se intentó investigar cualitativamente y cuantitativamente la presencia de representaciones semióticas de números complejos y magnitudes eléctricas en cuatro libros de texto y cambios cognitivos de estos representaciones. Se concluyó que, en estos libros, las representaciones algebraicas y algebraicas polar cartesiano predominan los enfoques de números complejos y, en consecuencia, también las conversiones de este tipo de representaciones. Este artículo muestra la aplicabilidad de la teoría de registros de representaciones semióticas en campos relacionados de las matemáticas.

1 Introdução

A relação entre números complexos e grandezas elétricas vetoriais advém do fato de que vetores planos (bidimensionais) podem ser interpretados como números complexos. Assim, o objeto matemático número complexo desempenha papel importante no desenvolvimento do conteúdo de disciplinas que abordem Circuitos Elétricos, normalmente em cursos de Engenharia Elétrica.

A Semiótica, em particular as representações semióticas, também vem se mostrando muito útil na abordagem de situações dos processos de ensino e de aprendizagem de Matemática pelas diversas maneiras de associações que se pode fazer a objetos matemáticos.

Este artigo pretende estudar não só a relação entre números complexos e grandezas elétricas vetoriais como, também, a maneira como esses assuntos são apresentados em alguns livros didáticos de cursos de Engenharia Elétrica.

Procurando seguir as orientações estabelecidas pela Metodologia da Análise de Conteúdo de Bardin (2016), foram escolhidos quatro livros didáticos da disciplina Circuitos Elétricos e foram estabelecidos dois pontos a serem observados na análise dos livros didáticos:

  1. ■ Em relação aos números complexos, quais e quantas representações semióticas e suas transformações cognitivas são apresentadas nos livros analisados?

  2. ■ Em relação às grandezas elétricas relacionadas a números complexos, quais e quantas representações semióticas e suas transformações cognitivas são apresentadas nos livros analisados?

2 Registros de Representações Semióticas

A Teoria dos Registros de Representações Semióticas (TRRS) foi introduzida por Raymond Duval (DUVAL, 1993). Foi sendo modificada e aperfeiçoada até hoje em dia em artigos e livros do autor (DUVAL, 1995, 2003, 2009, 2011) e tem se mostrado uma teoria e uma metodologia muito úteis nas pesquisas em Educação Matemática.

Segundo Santaella (2012, p. 19), a Semiótica é “a ciência que tem por objeto de investigação todas as linguagens possíveis, ou seja, que tem por objetivo o exame dos modos de constituição de todo e qualquer fenômeno como fenômeno de produção de significação e de sentido”.

Charles Sanders Peirce (1839 – 1914), Ferdinand de Saussure (1857 – 1913) e Gottlob Frege (1848 – 1925), com abordagens distintas no final do século XIX, são considerados os pais dessa da Semiótica.

Segundo Duval (2011), Saussure tem sua teoria baseada na análise estrutural dos sistemas semióticos, mais especificamente sobre a evolução das línguas indo-europeias, sendo um estudo baseado em linguística, e se limita aos significados dos sinais, no que se refere à imaterialidade do sinal e sua ocorrência; à diferença entre o sentido do sinal e à referência a um certo objeto.

Em relação a Peirce, Duval (2011) afirma que as proposições da sua teoria têm como conceito fundamental a descrição do papel das representações e dos sinais, em todas as formas de atividade cognitiva, desde suas adaptações no sistema semiótico ao qual pertencem até o nível de exploração científica das representações. A classificação de Peirce para os tipos de representação é feita de acordo com a semelhança (ícone e símbolo) e a causalidade (índice) entre o conteúdo e a representação do objeto.

Já sobre Frege, Duval (2011) afirma que ele propôs em sua teoria um processo semiótico para a produção de novos conhecimentos, dando ênfase aos signos como formas de escrita simbólicas aplicadas em Análise e em Álgebra.

A TRRS de Duval se apoia nas três visões de Semiótica propostas por Frege, Pierce e Saussure, e tem por objetivo aplicá-la a questões concernentes ao ensino e à aprendizagem de Matemática. Ele enfatiza a importância da utilização da abordagem semiótica, pois os objetos matemáticos só podem ser acessados por meio de suas representações semióticas.

Para Duval, um sistema semiótico é qualquer sistema de signos que sirva para a comunicação, o tratamento e a objetivação da informação.

As representações semióticas são produções obtidas pela utilização de signos de um determinado sistema semiótico, com regras de significado e de funcionamento, com a finalidade de expressar uma cópia, ou algo que remeta à lembrança, de um objeto. Todas as representações semióticas têm necessariamente forma e conteúdo. Podem ser imagens, gráficos, objetos, expressões grafadas, sons.

Ao ser produzida, é a forma da representação semiótica que determina o sistema semiótico ao qual ela está vinculada. Além da produção inicial, uma representação semiótica pode sofrer duas transformações cognitivas: o tratamento e a conversão.

O tratamento de uma representação semiótica transforma essa representação em outra representação semiótica que está vinculada ao mesmo sistema semiótico da representação original. A representação de um objeto é transformada em outra representação do mesmo objeto, sem mudar a forma da representação ou as operações pertinentes ao objeto matemático considerado. Ou seja, uma representação semiótica é transformada em outra, mas o sistema semiótico ao qual elas se vinculam se mantém.

A conversão de uma representação semiótica se dá entre sistemas semióticos distintos. A representação de um objeto é transformada em outra representação do mesmo objeto mudando a sua forma, portanto, mudando o sistema semiótico.

Duval (1995) chama de registro de representações semióticas, um sistema semiótico que permite que as representações semióticas vinculadas a ele possam sofrer as três transformações cognitivas: a produção, o tratamento e a conversão. É importante observar que todo registro é um sistema semiótico, mas nem todo sistema semiótico é necessariamente um registro.

Duval (1995) faz distinção entre a semiósis, a apreensão ou produção de uma representação semiótica de um objeto, e a noésis, a apreensão conceitual do objeto representado, mas afirma inseparabilidade existente entre elas. Para que haja a apreensão do conceito de um objeto matemático, é necessário que a noésis (conceitualização) aconteça por meio de significativas semiósis (representações).

Segundo Duval (1995), dificuldades de aprendizagem da Matemática estão relacionadas ao fato de que o aluno não consegue fazer a distinção entre o objeto matemático e sua representação. Esta distinção é um ponto estratégico para a compreensão da Matemática. Quando o objeto matemático é confundido com a sua representação, geralmente, o sujeito não atinge a total compreensão dos conhecimentos, situando-se fora do contexto da aprendizagem do objeto matemático.

Duval (2003) classifica os registros de representação quanto à sua natureza em monofuncionais e multifuncionais. Os registros monofuncionais permitem um único tipo de tratamento das representações a ele vinculadas. Esses tratamentos são algoritmizáveis, isto é, permitem o estabelecimento de alguma forma de tratamento algorítmico. Os registros multifuncionais permitem diversos tipos de tratamento das representações a ele vinculadas. Esses tratamentos não são algoritmizáveis.

Quanto à forma, Duval (2003) classifica os registros de representações semióticas em discursivos e em não-discursivos, e afirma: “os registros discursivos permitem descrever, inferir, raciocinar, calcular, enquanto os registros não discursivos permitem visualizar”.

A linguagem natural e a linguagem formal estão no âmbito dos registros discursivos, enquanto que figuras, gráficos e esquemas estão no dos não-discursivos.

Dessa forma, os registros de representações semióticas são classificados em quatro tipos diferentes, de acordo com sua funcionalidade e discursividade:

  1. ■ Registros da língua natural (discursivos e multifuncionais)

    ■ Registros figurais (não-discursivos e multifuncionais)

    ■ Registros simbólicos (discursivos e monofuncionais)

    ■ Registros gráficos (não-discursivos e monofuncionais)

O Quadro 1 sintetiza essa classificação.

Quadro 1
Tipos de Registros

Adaptado de Duval (2011, p. 14)

Segundo Duval (1995), para que o estudante adquira o conceito de um objeto matemático, é necessária a coordenação de representações semióticas desse objeto entre pelo menos dois registros distintos, sendo um multifuncional e outro monofuncional. O autor também afirma que nos níveis mais avançados do ensino da Matemática há uma predominância de registros monofuncionais e que os registros simbólicos prevalecem sobre os registros gráficos.

3 Números complexos e suas representações

Um número complexo é um número que se escreve na forma z = a + b.i, onde a e b são números reais e i2 = -1. A representação na forma z = a + b.i se chama a representação algébrica cartesiana desse número complexo.

Fixados dois eixos perpendiculares no plano cartesiano, um chamado eixo real e outro chamado eixo imaginário, cada número complexo z = a + b.i, pode ser identificado com um ponto P de coordenadas (a , b) desse plano, considerando o valor a sobre o eixo real (eixo das abscissas) e o valor b sobre o eixo imaginário (eixo das ordenadas). Esse plano é chamado plano complexo ou plano de Argand-Gauss. Essa representação é chamada a representação gráfica cartesiana desse número complexo. O Gráfico 1 ilustra esta situação.


Gráfico 1
Representação gráfica cartesiana de um número complexo
Agricco Junior (2017)

Esta forma de se representar um número complexo traz a ideia de que um tal número pode ser visto como um vetor que é a soma vetorial de dois vetores a = ( a , 0 ) , em que a é a parte real de z, e b = ( b , 0 ) , em que b é a parte imaginária de z. Assim pode-se representar um número complexo por z = a + b , na chamada representação gráfica vetorial de um número complexo. O Gráfico 2 ilustra esta situação.


Gráfico 2
Representação gráfica vetorial de um número complexo
Agricco Junior (2017)

O módulo de um número complexo z = a + b.i, denotado por |z|, é um número real não-negativo, que representa a distância do ponto P = (a , b) até a origem do plano complexo. Pode-se verificar que |z| é a medida da hipotenusa de um triângulo retângulo, cujos catetos medem respectivamente a e b.

Assim, |z|2 = a2 + b2 e | z | = a 2 + b 2

O argumento de um número complexo z = a + b.i denotado por Arg(z), é o arco Θ medido em radianos com 0 < θ 2 π , formado pelo semieixo positivo real e o segmento OP, em que O é a origem do sistema cartesiano e P = (a , b), como pode ser visto no Gráfico 3.


Gráfico 1
Módulo e argumento de um número complexo
Agricco Junior (2017)

Observa-se que se z = a + b.i e Argz = Θ, então a = |z| . cosΘ, e b = |z| . senΘ. Dessa forma, tem-se que z = a + b.i = |z| . cosΘ + i . |z| . senΘ, ou z = |z| . (cosΘ + i . senΘ).

Esta representação do número complexo z, conhecida como fórmula de Moivre, é chamada a representação algébrica trigonométrica desse número complexo.

Na disciplina Circuitos Elétricos, a forma trigonométrica de um número complexo z, z = |z| . (cosΘ + i . senΘ), é denotada por z = | z | θ e é denominada a representação algébricapolar de um número complexo.

As análises de circuitos elétricos em corrente alternada são simplificadas quando se leva em conta que as grandezas elétricas envolvidas: resistências elétricas, reatâncias capacitivas, reatâncias indutivas, impedâncias, tensões elétricas, correntes elétricas ou potências elétricas, são grandezas vetoriais e podem, assim, ser representadas por vetores planos. Essa representação permite que todas essas grandezas utilizadas em Engenharia Elétrica possam ser associadas a números complexos.

Quadro 2
Representações semióticas de um número complexo

Agricco Junior (2017)

O Quadro 2 sintetiza essas representações semióticas de um número complexo, classificadas conforme a vinculação aos registros semióticos nos quais são produzidas.

É importante observar a distinção feita entre o registro algébrico cartesiano e o registro algébrico polar, nos quais as representações, apesar de operarem com os mesmos sinais, têm regras de funcionamento diferentes. A multiplicação de números complexos nesses dois registros ilustra bem essa diferença de funcionamento e é mostrada no Quadro 3.

Quadro 3
Multiplicação de números complexos nas diferentes representações

Agricco Junior (2017)

Como já foi afirmado por Duval (1995), coordenar representações semióticas por meio de tratamentos e conversões é fundamental para a apropriação de um conceito matemático. A conversão de representações semióticas de um número complexo de um registro do tipo simbólico para um registro do tipo gráfico é fundamental, pois permite visualizar de forma indireta este objeto matemático.

Nos quadros 4 e 5 são dados exemplos de tratamentos e conversões entre representações semióticas de números complexos.

Como toda grandeza elétrica vetorial pode ser identificada com um número complexo, a nomenclatura para as representações semióticas dessas grandezas será idêntica à adotada para as representações semióticas de números complexos, porém é necessário introduzir duas outras representações semióticas dessas grandezas.

Quadro 4
Conversão de uma representação semiótica no registro algébrico cartesiano para uma representação semiótica no registro gráfico cartesiano

Agricco Junior (2017)

Quadro 5
Conversões e tratamentos entre registros de representações semióticas

Agricco Junior (2017)

A representação figural de um circuito elétrico é utilizada de forma usual para representar os circuitos elétricos físicos projetados para suas devidas aplicações. Tal representação será denotada por RF de um circuito elétrico. No Quadro 6 é apresentada uma representação figural de um circuito elétrico.

Quadro 6
Representação figural de um circuito elétrico.

Agricco Junior (2017)

As representações algébricas de grandezas elétricas são utilizadas nos livros didáticos de Circuitos Elétricos para denotar equações diferenciais, integrais, funções periódicas senoidais e cossenoidais, referentes a essas grandezas. O Quadro 7 apresenta a representação algébrica (RA) de uma função senoidal.

Quadro 7
Representação algébrica de uma função senoidal

Agricco Junior (2017)

4 Procedimentos metodológicos

Para proceder às análises desejadas procurou-se seguir a Metodologia da Análise de Conteúdo de Bardin (2016). As análises qualitativas do trabalho se destinaram a identificar a presença de representações semióticas nas seções dos capítulos dos livros didáticos dedicados às abordagens dos conteúdos relativos aos números complexos e às grandezas elétricas relacionadas a estes números.

Essa autora afirma que a análise de dados deve ser dividida em três fases subsequentes:

As diferentes fases da análise de conteúdo, tal como o inquérito sociológico ou a experimentação, organizam-se em torno de três polos cronológicos: 1) a pré-análise; 2) a exploração do material; 3) o tratamento dos resultados, a inferência e a interpretação. (BARDIN, 2016, p. 125)

A pré-análise é a primeira fase da análise, e objetiva a sistematização que possibilitará ao pesquisador a condução das operações sucessivas de análise, e ressalta:

É a fase da organização propriamente dita. Corresponde a um período de intuições, mas tem por objetivo tornar operacionais e sistematizar as ideias iniciais, de maneira a conduzir a um esquema preciso de desenvolvimento das operações sucessivas, num plano de análise. (BARDIN, 2016, p. 125).

A autora divide a pré-análise em três fases e afirma que:

Geralmente, esta primeira fase possui três missões: a escolha dos documentos a serem submetidos à análise, a formulação das hipóteses e dos objetivos e a elaboração de indicadores que fundamentem a interpretação final. (BARDIN, 2016, p. 125).

Ainda segundo Bardin (2016), as atividades a serem cumpridas para a organização do material compreendem cinco fases, que são:

  1. a. A leitura flutuante como atividade inicial para estabelecer o contato com os documentos;

    b. A escolha dos documentos;

    c. A formulação da hipótese e do objetivo da pesquisa;

    d. A referenciação dos índices e a elaboração de indicadores;

    e. A preparação do material.

A fase da exploração do material é realizada a partir da escolha do material a ser analisado, seguindo as hipóteses formuladas e os indicadores elaborados na fase da pré-análise, e percebe-se que a exploração do material é de suma importância, pois possibilitará o incremento das interpretações e inferência. De acordo com Bardin (2016, p. 131), “[...] esta fase, longa e fastidiosa, consiste essencialmente em operações de codificação, decomposição ou enumeração, em função de regras previamente formuladas”.

Acerca da categorização, Bardin (2016, p. 147) afirma ser “uma operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto por diferenciação e, em seguida, por reagrupamentos segundo o gênero (analogia), com os critérios previamente definidos”.

Na fase de tratamento dos resultados obtidos e interpretação de dados deve-se fazer uma opção por uma análise quantitativa ou qualitativa de dados. Para tanto, os dados devem ser agrupados de acordo com categorias para que sejam possíveis as análises.

A autora aponta para os significados de índice e indicadores em um trabalho de pesquisa:

[...] o índice pode ser a menção explícita de um tema numa mensagem. [...] o indicador correspondente será a frequência deste tema de maneira relativa ou absoluta, relativo a outros. [...] Uma vez escolhidos os índices, procede-se à construção de indicadores precisos e seguros. [...]. BARDIN (2016, p. 130).

Após o tratamento dos dados obtidos, feito por meio dos indicadores qualitativos e quantitativos, é realizada a interpretação desses dados, a fim de que seja possível realizar as inferências sobre tais dados. Sobre isto, Bardin (2016, p. 131) afirma que:

Os resultados brutos são tratados de maneira a serem significativos (“falantes”) e válidos. [...]. O analista, tendo à sua disposição resultados significativos e fiéis, pode propor inferências a adiantar interpretações a propósito dos objetivos previstos – ou que digam respeito a outras descobertas inesperadas.

Assim, procurando seguir as orientações da Metodologia da Análise de Conteúdo de Bardin (2016), foi estabelecido o seguinte roteiro para proceder à análise dos livros didáticos:

  1. ■ Escolha dos livros didáticos da disciplina de Circuitos Elétricos a serem analisados;

    ■ Estabelecimento dos indicadores a serem pesquisados;

    ■ Tratamentos dos dados.

Para a escolha dos livros didáticos a serem analisados foi estabelecido o seguinte critério constituído das seguintes etapas:

  1. ■ Escolha das universidades nas quais é oferecido o curso de Engenharia Elétrica;

    ■ Escolha dos livros didáticos de Circuitos Elétricos citados nas bibliografias básicas dos planos pedagógicos de cursos de Engenharia Elétrica e planos de ensino da disciplina Circuitos Elétricos e similares de tais universidades;

    ■ Eleição dos quatro livros mais citados.

Para cumprir essas etapas foram estabelecidas as seguintes condições para proceder à escolha das universidades:

  1. ■ Levantamento de dez universidades brasileiras públicas e privadas que oferecem o curso de Engenharia Elétrica;

    ■As disciplinas de Circuitos Elétricos I e II ou similares fossem oferecidas nas grades curriculares;

    § Os planos pedagógicos de curso e planos de ensino estivessem disponíveis para a pesquisa por acesso on-line.

Foram escolhidas as seguintes universidades e as pesquisas de planos de ensino foram realizadas nos sites das instituições:




Os livros mais citados nas bibliografias foram:




E os resultados encontrados estão consolidados na Tabela 1.

Tabela 1
Livros mais citados nas bibliografias da disciplina Circuitos Elétricos

Agricco Junior (2017)

Sendo assim, decidiu-se pela escolha dos Livros 1, 2, 3 e 4 para serem feitas as análises. Em seguida, passou-se à fase de elaboração e categorização dos indicadores.

5 Resultado e discussão

Para os números complexos, a análise foi feita segundo a categorização que é apresentada no Quadro 8, e para as grandezas elétricas, a análise seguiu a categorização apresentada no Quadro 9.

Finalmente passou-se à fase de análises dos livros escolhidos.

Estas análises foram separadas em dois grupos: análises sobre as representações semióticas de números complexos e análises sobre as representações semióticas de grandezas elétricas relacionadas ou não a números complexos, utilizando as categorias definidas nos Quadros 8 e 9.

Quadro 8
Categorização dos índices estabelecidos para a análise dos números complexos

Agricco Junior (2017)

Quadro 9
Categorização dos índices estabelecidos para a análise das grandezas elétricas

Agricco Junior (2017)

Nas análises procuramos seguir a seguinte ordem:

  1. a. Tipos de representações semióticas apresentadas nas explanações teóricas das seções dos capítulos analisados;

    b. Tipos de representações semióticas apresentadas nos enunciados dos exercícios resolvidos;

    c. Quantidade de tratamentos de representações semióticas utilizadas nos exercícios resolvidos;

    d. Quantidade de conversões de representações semióticas utilizadas nos exercícios resolvidos; e

    e. Tipos de representações semióticas apresentadas nos enunciados dos exercícios propostos.

Enfim foram feitas as análises dos quatro livros escolhidos e seus detalhes podem ser consultados em Agricco Junior (2017). São apresentadas, em seguida, apenas as consolidações dessas análises.

As Tabelas 2, 3, 4, 5 e 6 apresentam as consolidações das análises referentes às quantidades das representações semióticas dos números complexos encontradas nas explanações teóricas, nos enunciados dos exercícios resolvidos dos livros analisados e nos enunciados dos exercícios propostos, além das transformações de tratamento e conversões de representações semióticas presentes nos exercícios resolvidos.

Tabela 2
Tipos de representações semióticas de números complexos presentes nas explanações teóricas

Agricco Junior (2017)

Tabela 3
Tipos de representações semióticas de números complexos presentes nos enunciados dos exercícios resolvidos

Agricco Junior (2017)

Tabela 4
Quantidade de tratamentos de representações de números complexos utilizados nos exercícios resolvidos

Agricco Junior (2017)

Tabela 5
Quantidade de conversões de representações de números complexos utilizadas nos exercícios resolvidos

Agricco Junior (2017)

Tabela 6
Tipos de representações semióticas de números complexos presentes nos enunciados dos exercícios propostos

Agricco Junior (2017)

Os resultados das tabelas 2, 3 e 6 mostram que as representações semióticas de números complexos mais utilizadas nas explanações teóricas, nos enunciados dos exercícios resolvidos e nos enunciados dos exercícios propostos, mesmo que em números diferentes entre si em cada livro analisado, foram as representações algébricas. As representações gráficas foram pouco utilizadas, sendo que, em alguns dos livros analisados, alguns tipos delas nem chegaram a ser utilizadas. Tal conclusão vai de encontro à afirmação de Duval (1995) de que há predominância dos registros monofuncionais, e que as representações simbólicas prevalecem sobre as representações gráficas. A tabela 5 mostra que o Livro 2 é o que mais explora as conversões de representações semióticas de números complexos, e, portanto, é o que mais se aproxima das orientações de Duval (1995) de que os estudantes devem ser estimulados a dominar as conversões entre registros distintos para conhecer uma assunto com mais profundidade. Mostra também que as conversões entre os registros algébrico cartesiano e algébrico polar foram as que predominaram.

As Tabelas 7, 8, 9, 10 e 11 apresentam as consolidações das análises referentes às quantidades das representações semióticas das grandezas elétricas associadas a números complexos e encontradas nas explanações teóricas, nos enunciados dos exercícios resolvidos dos livros analisados e nos enunciados dos exercícios propostos, além das transformações de tratamento e conversões de representações semióticas presentes nos exercícios resolvidos.

Tabela 7
Tipos de representações semióticas de grandezas elétricas associadas a números complexos presentes nas explanações teóricas

Agricco Junior (2017)

Tabela 8
Tipos de representações semióticas de grandezas elétricas associadas a números complexos presentes nos enunciados dos exercícios resolvidos

Agricco Junior (2017)

Tabela 9
Quantidade de tratamentos de representações semióticas de grandezas elétricas associadas a números complexos utilizados nas resoluções dos exercícios resolvidos

Agricco Junior (2017)

Tabela 10:
Quantidade de conversões de representações semióticas de grandezas elétricas associadas a números complexos utilizadas nas resoluções dos exercícios resolvidos

Agricco Junior (2017)

Tabela 11
Tipos de representações semióticas de grandezas elétricas associadas a números complexos presentes nos enunciados dos exercícios propostos

Agricco Junior (2017)

Os resultados das tabelas 7, 8, 9,10 e 11 mostram que as representações semióticas de grandezas elétricas relacionadas a números complexos mais utilizadas nas explanações teóricas, nos enunciados dos exercícios resolvidos e nos enunciados dos exercícios propostos, mesmo que em números diferentes entre si em cada livro analisado, foram as representações algébricas. As representações gráficas foram mais uma vez pouco utilizadas, sendo que, em alguns dos livros analisados, alguns tipos delas nem chegaram a ser utilizadas. Novamente, tal conclusão vai de encontro à afirmação de Duval (1995) de que há predominância dos registros monofuncionais, e que as representações simbólicas prevalecem sobre as representações gráficas. A tabela 10 mostra que agora foi o Livro 4 que mais utilizou as conversões entre diferentes registros, e mais se aproximou das orientações de Duval (1995) acerca da construção de conhecimento sobre determinado assunto, e que as conversões do registro algébrico cartesiano para o registro algébrico polar, e vice-versa, foram as mais utilizadas.

A conclusão final é que o ensino dos conteúdos de circuitos elétricos baseado nesses livros acarreta uma visão altamente algébrica para a teorização e para as resoluções dos exercícios. Talvez uma abordagem com mais representações gráficas facilitasse os processos de ensino e de aprendizagem desse tema. Um incremento de utilização de conversões de representações também seria desejável. Outra conclusão é que a Teoria dos Registros de Representações Semióticas pode ser aplicada em áreas afins da Matemática, como a Engenharia Elétrica, o que mostra a força dessa teoria.

Referências

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