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Teatro e tradução em campo expandido

2025-10-16

Dentre os desmembramentos de determinados vocábulos canônicos como literatura, teatro, performance, texto, e discurso, vimos surgir a partir deles terminologias em um campo cada vez mais expandido, a saber: “literariedade”, “teatralidade”, “performatividade”, “textualidade”, “discursividade”, entre outros. Tais desmembramentos parecem apontar para o esgarçamento das fronteiras que conectam diferentes áreas no campo da cultura. A ideia do artista e da própria escrita como campo etnográfico direciona a nossa atenção para a tensão entre “o artista como produtor” - apontado por Walter Benjamin (1934), cuja função da obra de arte estaria na sua capacidade de dinamizar a cultura dentro de um determinado contexto social e, inevitavelmente, a partir uma lógica de produção semelhante a da produção de mercadoria -, e o “artista como etnógrafo”, a partir da qual, e segundo Hal Foster (1996), a obra de arte é composta pela tessitura de diferentes culturas, em um permanente jogo de “outridades” e de apropriações. Patrice Pavis, em O teatro no entrecruzamento de culturas, assinala que teatro é um texto que anda, com isso quer dizer que é um texto que não apenas está em movimento através das falas dos atores, mas que caminha por diferentes culturas e línguas, dos iniciais estágios da montagem de uma peça (escolha de tradução, escolhas cênicas de direção, desenvolvimento dos atores, caracterização) até a síntese que incorpora o contexto sócio-cultural da peça apresentada. Terry Hale e Carole-Anne Upton (2014) notam que o teatro, com sua efemeridade e flexibilidade contextual, propiciam, a partir da tradução e performance, uma inerente potência à diversidade. A ambiguidade entre traduzir, adaptar e recriar é inerente ao modo de ser do teatro como ação performática. A própria força do teatro residiria nessa impermanência, na constante abertura à reinvenção. Esperando Godot em Sarajevo de Susan Sontag, Esperando Godot no fim do mundo (montagem Teatro Oficina), Esperando Godot (montagem em Nova Orleans, 2007) são exemplificações do que Barbara Godard (2000, p.33) afirma ao dizer que “O diálogo teatral tem forte afinidade com o discurso de uma sociedade: traduzindo esse diálogo, o tradutor está sujeito a duas restrições, não pelas àquelas de um determinado texto fonte, mas também àquelas das pragmáticas do meio alvo.” De uma tradução clássica que suscite discussão sobre a originalidade do texto posto como “original” e a pertinência da fidelidade, assim como o movimento que o tradutor desencadeia em uma tradução experimental, como a de Anne Carson, ou antropofágica como a do Teatro Oficina, a obra teatral parece incidir sobre a proposta de intraduzibilidade de Barbara Cassin (2018), não como aquilo que não pode ser traduzido, mas como aquilo que constantemente pede tradução. A partir disso, esse dossiê temático convida autores a submeterem artigos/ resenhas/ entrevistas que discutam questões neste entrecruzar de literariedades, teatralidades, performatividades e traduzibilidades no campo dos estudos teatrais.

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Vol. 13 No. 1 (2025): Escrita e pulsão: a literatura e seus destinos
Published: 2025-06-09
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